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Um escritor, um poeta, um aventureiro,

Saturday, 29 August 2009

Referendum-10 Anos: SE EU SOUBESSE QUE "ERA" ASSIM O NOSSO DESTINO, EU NÃO LUTAVA

Encontrei este poema no site: http://www.geocities.com/joseramelau/diasporatimorense.
Acrescentei mais algumas palavras.

O TEMPO PARA REPENSAR

SE EU SOUBESSE QUE "ERA" ASSIM O NOSSO DESTINO, EU NÃO LUTAVA

Eu que andei na luta, que perdi a minha infância, a juventude, a minha formação e o futuro.
Eu que assisti à guerra, aos sofrimentos, às dores, às tristezas e às lágrimas.
Eu que vi a morte dos meus pais e a violações das minhas irmãs.
Eu que chorei pelo meu pai morrendo, pela minha mãe violada, pelo meu filho perseguido, pelo meu irmão desaparecido, pelo meu íntimo amigo esfaqueado,
pelo meu tio que chorou por causa da minha tia que foi violada e pelos meus
bens que foram saqueados.
Eu que percorri montanhas de Timor Lorosa'e, "sae foho, tun foho", com arma M-16 na mão, sem bebida nem comida e deixei a mulher e os filhos nas perseguições e ameaças, deixei o meu estudo e trabalho, deixei todo o meu ser: jovem, filho (a) e pai e mãe.
E, eu que andei por todo o lado do mundo, deixei o meu emprego e o meu futuro, abandonei os meus filhos e a minha mulher.

Se eu soubesse que tu ias chamar-me mestiço, árabe e indiano, eu não lutava.
Se eu soubesse que tu ias praticar a corrupção e o nepotismo, eu não lutava.
Se eu soubesse que tu ias chamar-me "sarjana super mi", eu não lutava.
Se eu soubesse que tu ias chamar-me "fuk foer, fuk naruk, fuk la fase", eu não lutava. Se eu soubesse que tu ias chamar-me "caixote em vez de caixa", eu não lutava. Se eu soubesse que tu ias chamar-me comunista, cobarde, oportunista e traidor, eu não lutava.
Se eu soubesse que tu ias esconder a verdade, eu não lutava.
Se eu soubesse que "era" assim o nosso destino, eu não lutava.

Se tu estivesses no meu lugar, já tinhas morrido.
Se tu estivesses no meu lugar, já te tinhas rendido.
Se tu estivesses no meu lugar, preferias viver sossegado em vez de seres vítima, em nome da liberdade e da independência.

"Era", ninguém me questionou acerca da minha raça, convicção, religião, estudo, trabalho, ideologia, partido, relação e família.

Eu lutei para que gente desta terra possa dizer «sou…sou…independente», e
ter harmonia, tranquilidade, liberdade, paz e justiça.
Eu não lutei para a injustiça e a incerteza do meu futuro.

Afinal, quem é que ganha com tudo isso?
Afinal, para que lutámos ? Para que sofremos ?

Se continuarmos assim, não seremos livres e independentes.
Se continuarmos assim, a Indonésia rir-se-á.
Se continuarmos assim, seremos todos "hipócritas".

Agora, é tempo de repensar…
BASTA !!!
A guerra civil entre nós.
As confrontações entre nós.
As manipulações e explorações entre nós.

Agora, a liberdade já é nossa, e
As cinzas também são nossas.

Celso Oliveira,
poeta timorense

(nota: Poema publicado no Diário de Notícias em Fevereiro de 2003)

1 comment:

  1. Prezado Poeta Celso Oliveira. Entendo bem o seu desencanto expresso neste seu poema «SE EU SOUBESSE QUE "ERA" ASSIM...». Tambem eu me sinto frustrado relativamente à "democracia" que se instalou em Portugal. Não foi para isto que lutei contra o anterior regime.
    Mas não abandonemos a UTOPIA, para que ela não nos deixe sós. Continuemos a luta com as armas e as munições que ainda temos: a caneta e as palavras.
    Recordando os momentos difíceis de 1999, no pós-referendo em seu Timor, aqui deixo este meu poema que dedico ao seu País e a seu Povo:

    A TIMOR LORO SA'E

    Move-se o tempo indefenidamente,
    e o sofrimento é teu, cresceu contigo.
    A injustiça alastra livremente
    ao sabor do prazer do inimigo.

    Mas o combate, mudo e resistente,
    que travas com as armas da razão,
    sustenta a fé, dá força à tua Gente
    p'ra libertar de vez essa Nação.

    Feras à solta, o ódio e o terror
    teu Povo Herói e Mártir vencerá.
    Tal a certeza, qual a sua dor.

    O mundo, adormecido, acordará,
    mas só teu Povo te fará o TIMOR
    DO SOL NASCENTE, onde o Sol brilhará!

    Maia-Portugal, 11 de Setembro de 1999, in: Sérgio O. Sá - VERSOS NA GUERRA - VERSOS DE PAZ

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