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Sunday, 17 May 2009

A mensagem de Dom Ximenes Belo na Comemoração do 7º aniversário da independência de Timor.

Trabalhar pela Independência de Timor-Leste, sendo bom cidadão em qualquer parte do mundo…Estudar, trabalhar, ser patriota respeitando os concidadãos e os estrangeiros, formando com todos a grande família humana, Dom Carlos Filipe Ximenes Belo.



Celebramos este ano da graça do Senhor, 2009, o 7º aniversário da independência de Timor. Considero a independência como um graça de Deus para o Povo Timorenses, e como um esforço e resultado da luta heróica de todos os timorenses. Como Estado, Timor, juridicamente começou a existir a partir de 20 de Maio de 2002. Como Nação, Timor oriental já era uma realidade antes dessa data. E Timor é a nossa Pátria, a Pátria timorense.

Esclareçamos um pouco estes três conceitos.
Nação: Segundo a definição dada pelo historiador português João Ameal, a nação é uma “ comunidade histórica de cultura. Funda-se numa história comum, e afinidade de espírito e instituições (mentalidade, educação, estilo de vida e de relações sociais, valores éticos, maneira de estar no mundo, inserção na natureza) e num sentimento de destino comum” (in Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, Verbo, vol. 13, col. 1641). A nação é a realidade onde se nasce e é uma realidade sócio-histórica. Cada nação distingue-se pelas condições de que surge. Diferenciação linguística, étnica, religiosa, geográfica, política. “A nação corresponde a um conceito cultural onde ressaltam elementos culturais” (ibidem, vol. 14, col. 1464). Há nações que não são estados (ex. Os Curdos, talvez, os batak na Sumatra, Papua Barat, etc).

Pátria, é terra dos pais, é uma realidade natural. “A pátria assenta em elementos de afectividade” (ibidem, vol. 14, col. 1464. “Enquanto a nação realça o aspecto pessoa, a pátria tende a identificar-se com um território-pátria ou terra dos pais” (ibidem, idem). O amor, a veneração, a dedicação à Pátria, todos estes sentimentos chamam-se patriotismo. “Este sentimento natural de dedicação leva os concidadãos, de todas as classes sociais, a promover a grandeza, a glória e o bem-estar da mãe-pátria. Baseia-se o patriotismo na existência de um património comum – constituído pelo solo, paisagem, lar, história e culturas próprias – que se estima e se de defende. O patriotismo é o prolongamento do amor à pátria , já que a Pátria é o lar comum de muitas famílias vinculadas por estreitos laços étnicos, históricos e culturais” (M. Alves de Oliveira, art. Patriotismo, in Idem, vol. 14, col. 1415).
O patriotismo impõe aos cidadãos a obrigação de preferência e de estima, de respeito com a história, de gratidão pelos bens que nos presta, de serviço patenteado na obediência ás leis e na cooperação para o progresso em todos os sectores da vida nacional, e de vigilância para a defender tanto dos inimigos internos como dos externos.
Segundo o Papa Leão XIII, na encíclica Sapientia Christiana (10.1.1890), “a lei natural manda-nos amar com amor de predilecção e de sacrifício o país onde nascemos e fomos educados, até ao ponto de o bom cidadão não recear a vida em defesa da sua pátria”.
O Concílio Vaticano II espera que “os cidadãos cultivem com magnanimidade e lealdade o amor da Pátria, mas sem estreiteza de espírito, de maneira que ao mesmo tempo, tenham sempre presente o bem de toda a família humana” (Gaudium et Spes, nº 75). O patriotismo não deve levar a extremismos, como nacionalismo, que é a exaltação da própria nação. (Nazismo etc…)

Estado : “A ideia de estado a de um conjunto humano, um território e um poder político estritamente funcionalizado, isto é, juridicamente orientado para objectivos que transcendem os fins pessoaos daqueles que o exercem” ( M. Galvão Teles, art. Estado, in Enciclopédia Luso Brasileira – Verbo, vol. 7, col 1357).
Antes de 2002, o que havia em Timor Oriental era a realidade Nação, e não Estado. O Estado como entidade jurídica só existe a partir do 20 de Maio de 2002, com o reconhecimento da Comunidade internacional, com a existência de instituições de estado (Presidência, Governo, Parlamento e Tribunais).
A partir de 20 de Maio de 2002, com o reconhecimento da comunidade internacional, o princípio da nacionalidade veio afirmar o direito da nação timorense a dar corpo a um Estado, e então domina o conceito de Estado como nação politicamente organizado. Nesse contexto, já se podia falar de uma “soberania nacional, para dizer que o poder político pertence ao conjunto de cidadãos enquanto unidade de ordem” (ibidem, vol. 13, col, 1642).
Todo o cidadão tem o dever de contribuir para o desenvolvimento e progresso da sua Pátria, Timor-Leste. Essa contribuição será mais eficaz se passar por uma boa educação política. Todos os timorenses precisam de uma educação política. Como disse um pedagogo: “A política foi sempre importante, porque importantes foram os problemas do homem e a sociedade” ( Américo Veiga, Educação Hoje, sétima edição, p.319). Por isso, ninguém pode ficar indiferente perante o problema político, Com razão Aristóteles definiu o homem como “animal político”. “Alhear-se desse problema é alienar-se como homem e demitir-se de uma das suas dimensões fundamentais”, afirma o pedadogo Américo Veiga” (ibidem, idem, p. 319).

Política. A palavra “política” é a forma adjectivada do vocábulo grego “Polis”, que significa “cidade”, ou mais propriamente, “sociedade”, já que para os Gregos só eram “Polis” as cidades-estados (ex.: Atenas, Esparta, etc). Política, portanto, é tudo o referente à organização da sociedade em função do homem e de todos os homens. “ Mais concretamente: Política é o conjunto de princípios, leis, instituições e acções referentes à organização, vida e administração da sociedade ( a nível local, regional, nacional e internacional), ao bem comum, ao exercício do poder, aos direitos e deveres dos cidadãos, às relações entre si e com a autoridade ( e vice-versa), de modo que tudo concorra da melhor maneira para o bem comum” (Américo Veiga, op.c it. P. 320). Mais concretamente, quando falamos da política, queremos significar o governo dos cidadãos feita pelos seus representantes. Entenda-se, um governo democrático.

A democracia vem de dois vocábulos gregos: “demos”, que significa “povo”; e “cratos”que quer dizer “poder”. Democracia, significa, portanto literalmente “poder do povo, “é o governo do povo, para o povo e pelo (com) o povo” (atribui-se a Lincoln esta clássica definição da democracia). Quer dizer que o poder reside no povo e é do povo. Sendo do povo, é o povo que tem o direito de escolher a maneira como esse poder deve ser exercido, as pessoas que vão exercer e o modo como tomar parte nas decisões mais importantes.
“É princípio aceite que a democracia é um regime que respeita a pessoa, os seus direitos fundamentais e a sua liberdade; e que, para isso, está organizada de forma participada e pluralista, segundo determinadas regras. Essas regras são nomeadamente:
- Distinção dos poderes (legislativo, executivo e judicial;
- império do direito (força do direito);
- independência dos tribunais;
Electividade periódica e livre, por todos os cidadãos, dos órgãos de soberania ou, pelo menos, dos mais importantes. (Carta pastoral do Conferência espiscopal portuguesa, 1979, 13). E ainda a subordinação do poder militar e económico ao civil ou político.
Num país democrático, há pluralismo de opções políticas. Não pode haver democracia verdadeira sem possibilidade efectiva de pluralismo político e sem respeito pelas diferentes maneiras de encarar e organizar a sociedade. Daqui a existência de vários partidos.

Partidos políticos: Para a realização da administração da “Coisa pública” (res publica), os cidadãos organizam-se em associações, cuja função é intervir no exercício do poder político. Através da realização de um programa, normalmente inspirado numa ideologia, contando por isso, com o apoio popular. “Um partido político supõe, no mínimo, estes elementos: uma base ideológica; um programa de acção e de fins gerais; filiados; vocação para o exercício do poder e para a intervenção na vida pública, certo apoio popular; e uma estrutura organizativa adequada” (cf Veiga, p. 326).
Conforme a existência e a natureza dos partidos, temos os seguintes regimes políticos: regime de partido único (Vietname, Coreia do Norte, China); regime bipartidário (USA( Partido Republicano e Partido democrático); Inglaterra( Partido Conservador e Partido Trabalhista), Austrália, etc. Apesar da existência doutros partidos mais pequenos, a vida política da nação anda à volta de dois grandes partidos, alternando-se frequentemente no poder; regime pluripartidário (Índia, Portugal, Timor Leste, etc.).

Ideologia : Falamos acima que os partidos devem ter como base uma ideologia. Este vocábulo foi forjado durante a Revolução Francesa por um grupo de filósofos (principalmente Desrutt de Tracy), designando segundo eles a “ciência das ideias”. Daí passou a significar um programa de reforma política que essa “ciência” apoiava e justificava. Foi, sobretudo, a partir de Marx, que surgiram vários movimentos ideológicos: socialismo reformista, marxismo-leninismo, estalinismo, maoísmo, titismo (Tito, da Jugoslávia), castrismo (Fidel Castro),. A par disso, predominavam e predominam outras ideologias: o liberalismo, o neo-liberalismo, o nacional-socialismo, o fascismo e o nacionalismo. A “significação destes movimentos ideológicos parece tratar-se entre a visão teorética do mundo, da sociedade e do homem, e a vontade operatória de a traduzir num programa de acção tanto como símbolos e instituições” Manuel Antunes, art. Ideologia, in Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, Verbo, vol. 10, col. 816-817).
Voltando aos partidos políticos (No Ocidente) e olhando para sua história, podemos agrupá-los nas seguintes correntes ou famílias político-partidárias:
Fascistas ou fascizantes – extrema-direita
Conservadores e liberais – direita
Democratas-cristãos - centro
Sociais-democratas - centro-esquerda
Socialistas - esquerda
Comunistas e outros afins – extrema-esquerda
NB/ esta classificação pode ser arbitrária…
Em relação è república de Timor-Leste, qual a ideologia predominantes dos partidos políticos ali existentes’?
Atenção: o melhor partido ou o melhor sistema sócio político é aquele que souber conciliar as dimensões fundamentais da pessoa humana (dimensão individual: “um ser-em-si); dimensão social (um ser para-os-outros), dimensão transcendental (Um ser- para-o-Outro).
Quando numa nação, se dá mais importância ao Individual, temos o liberalismo ou capitalismo liberal; quando se dá demasiada importância ao social, temos o colectivismo marxista ou capitalismo de Estado. E quando predomina o Transcendente, cai-se no confessionalismo estatal e materialismo ateu ou prático.
A individualidade acentua mais a liberdade, a iniciativa e a criatividade de cada ser humano.
A sociabilidade acentua mais a igualdade, a solidariedade, e a justiça social. O importante é saber conciliar estas duas dimensões
A nível sócio-económico ou economia social de mercado. Economia de mercado: defende a liberdade, a iniciativa e o estímulo como a melhor maneira de incentivar a produção de bens necessários a todos, e social, chamando a atenção para a vertente social da pessoa e dos bens, a solidariedade e a justa distribuição desses bens, pois todos temos uma igual dignidade fundamental e direitos aos bens necessários.
A acentuação unilateral da individualidade e da liberdade pessoal (capitalismo) gerou a exploração de muitos por alguns, a discriminação e as grandes diferenças sociais;
Por outro lado, a acentuação unilateral da igualdade e da sociabilidade (socialismos e comunismos) gerou a opressão, a morte de iniciativas e de liberdade, a miséria, etc.

Em nível político. O não respeito pela individualidade e liberdade dá lugar às ditaduras; o seu respeito, conciliado com a sociabilidade dá origem às democracias.

Participação dos cidadãos na construção do País:
O objectivo fundamental que exige a participação dos cidadãos é a construção do BEM COMUM. Bem comum é o “conjunto de condições de vida social que permitam, tanto aos grupos como a cada membro, alcançar mais plena e facilmente a própria perfeição” (GS, 26) em todos os aspectos e dimensões de vida. Concretamente :
- o reconhecimento, tutela e promoção da dignidade humana, dos seus direitos e deveres.
- o acesso, por parte de todos, ao desenvolvimento económico, social e cultural verdadeiramente humano.
- ao usufruto generalizado dos chamados serviços essenciais, como por exemplo: transportes, comunicações, habitação, água, assistência sanitária, trabalho em condições dignas, lazeres, etc.
- salvaguarda da independência, da cultura e da personalidade de todo o povo;
- o esforço de coordenação e convergência das energias dos cidadãos para o bem de todos.
Trabalhar para o bem comum é direito e dever de todos, mas em primeiro lugar dos que são chamados a gerir a “res pública”. Os governantes não existem para dominar ou para privilegiar os clientes, mas para servir o bem comum de todos, segundo o âmbito da sua autoridade, dentro do espírito de justiça e equidade.

Para os Estudantes Universitários:
Podemos apontar vários campos de intervenção: 1) o serviço à pessoa humana; 2) o serviço à cultura; 3) o serviço à economia; 4) o serviço à política.
Pessoa humana: a dignidade incomensurável de toda e qualquer ser humano deriva do facto de ser PESSOA. Pessoa, isto é, um ser dotado de inteligência, vontade, capacidade de auto-determinação, consciência e liberdade. Não sacrificar a pessoa ou povos às ideologias e sistemas políticos.
Direitos humanos: Dessa dignidade da pessoa e das suas dimensões essenciais deriva um conjunto de direitos. Alguns deles, dizem-se fundamentais, porque deles derivam sucessivamente outros. Os direitos fundamentais são universais, invioláveis e inalienáveis: procedem da natureza humana não concessão de qualquer Estado; por isso, são de todos e de cada um dos homens. E ninguém lhos pode tirar.
Cultura”A cultura é aquilo pelo qual o homem enquanto homem se torna mais homem”. A Declaração Universal do Direitos Humanos enumera o direito à educação e à participação da vida cultural como um dos direitos fundamentais da pessoa humana. Acontece que mesmo depois da independência, muitos timorenses não sabem ler, escrever e contar. Cultura, educação, escola traz consigo outros temas inerentes como a orientação profissional, a educação permanente, o insucesso escolar. Só através da cultura tem o timorense pleno acesso aos bens da civilização. Conhecer, promover e guardar o património cultural do povo timorense., mas estará também aberto aos bens culturais da humanidade.
Economia: elevar o nível social e económico dos timorenses, através da criação dos postos de trabalho, no melhoramento das estruturas de agricultura, indústria e comércio.
Política, já se falou acima…Mas convém vincar a educação para a política, para a cidadania, para os direitos humanos.
Problemas da Paz, Justiça, Reconciliação e Perdão…Todo o Estudante e Universitário podem e devem ser “Embaixadores” de Paz, em Timor e no mundo.

Conclusão:
Trabalhar pela Independência de Timor-Leste, sendo bom cidadão em qualquer parte do mundo…Estudar, trabalhar, ser patriota respeitando os concidadãos e os estrangeiros, formando com todos a grande família humana.

Porto, 16 de Maio de 2009.


Dom Carlos Filipe Ximenes Belo

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