Chega ao Brasil Réquiem para o Navegador Solitário, de Luís Cardoso, considerado o primeiro romancista do país
Roberta Pennafort - O Estadao de S.Paulo
RIO - Quando criança, no Timor Leste, o imaginário do pequeno Luís era impregnado por histórias da invasão japonesa à ilha, antiga colônia portuguesa, durante a Segunda Guerra Mundial. As histórias se multiplicaram em sua cabeça muito por conta da participação de seu pai na luta contra os invasores. O garoto cresceu, foi estudar em Portugal, transformou-se num belíssimo escritor - é considerado, no Ocidente, o primeiro romancista timorense -, e finalmente está sendo lançado no Brasil.
Réquiem para o Navegador Solitário sai pela editora Língua Geral, dentro da coleção Ponta de Lança, que apresenta autores lusófonos desconhecidos do público brasileiro - embora apenas um quinto dos timorenses falem português, a nossa língua é o idioma oficial por lá.
O livro saiu em 2007 em Portugal, país onde Luís Cardoso vive desde 1975. Já foi traduzido para vários idiomas, como inglês, alemão, holandês e francês. O escritor, que conhece pouco o Brasil, apesar de já nos ter visitado oito vezes, virá para o lançamento em Brasília, no dia 25; no Rio, será no dia 30.
O navegador solitário é Alain Gerbault, um francês que entrou para a história por ter feito uma viagem de circunavegação da Terra sozinho, num barco pequeno. A jornada começou em 1923 e durou 700 dias. Gerbault morreu em Díli, capital de Timor, em 1941. O personagem fascinava Cardoso, assim como outros estrangeiros que aportavam por lá.
A figura central de Réquiem, seu quarto romance, é Catarina, uma jovem inocente que viaja a Díli, pouco antes da guerra, atrás de seu noivo. Na mala, A La Poursuite du Soleil (em busca do sol) o relato da viagem escrito por Gerbault e publicado em 1929. Além de Catarina, outra personagem importante é a própria ilha do Pacífico, seus conflitos e delícias.
Réquiem leva o leitor numa interessante viagem pela terra de Cardoso. "Este é o livro que eu quis escrever desde a infância. Ainda pensei num título: Deus e o Diabo na Terra do Sol. Mas isso seria roubar o gênio a Glauber Rocha", brinca.
No seminário. Escritor de um país que praticamente não lê, Cardoso tem 51 anos. Nasceu em Cailaco, vila no interior do Timor. É filho de um enfermeiro e de uma dona de casa, irmão de dez. Estudou num seminário de jesuítas, onde aprendeu português, latim, grego, inglês e francês.
Já em Portugal, licenciou-se em silvicultura pelo Instituto Superior de Agronomia de Lisboa. Deu aulas de tétum, a língua falada pela maioria dos timorenses, e também de português. A virada para a literatura veio com o auxílio de José Eduardo Agualusa, o escritor angolano conhecido dos brasileiros. Eles estudavam juntos, e Agualusa viu em Cardoso um ficcionista de mão cheia.
O primeiro livro, Crônica de uma Travessia, foi publicado em 1997 pela editora Dom Quixote, a mesma de Agualusa. Com uma obra identificada com o realismo mágico (como García Márquez e Cortázar), Cardoso acabou mais conhecido em Portugal do que no Timor.
Ainda não se sabe se outros títulos sairão no Brasil. Cardoso cruzou oceanos para estar aqui nos anos 80, quando conheceu o então líder sindical Luiz Inácio Lula da Silva. Com ele, conseguiu apoio na luta pelos direitos humanos no Timor. O Brasil o encanta, o Rio especialmente.
"Sei ainda muito pouco do Brasil que gostaria de conhecer. Talvez precise de outra vida para concretizar isso", diz Cardoso, que sonha com dias de turista na cidade, entre o Cristo Redentor e o Pão de Açúcar. "Esta é minha primeira viagem ao Brasil desde a independência do Timor (em 99). No tempo da resistência (em Portugal, fez parte da Frente Diplomática de Timor, contra a presença indonésia) fiz viagens sempre a trabalho. Nem sequer tive tempo de cumprir uma promessa de ir até o Corcovado dar um abraço no Senhor, que lá está de braços abertos, à minha espera."
Apesar de rejeitar o título de "o escritor oficial de Timor", ou "o primeiro", ele sabe que por meio de seus livros apresenta seu país aos demais. Por conta deles, é chamado a dar palestras em universidades mundo afora.
"Acho que a tradição oral é o grande manancial da literatura timorense", avalia Cardoso. "É preciso trazê-la para a escrita. E isso cabe aos escritores. Tenho feito a minha parte. É na literatura oral que vamos buscar mitos e ritos, as tradições e todo um imaginário de identidade." Do Brasil, os timorenses se identificam com o futebol e as novelas da TV Globo.
RÉQUIEM PARA O NAVEGADOR SOLITÁRIO (Portugal)
Luís Cardoso
Editora: Língua Geral (303 páginas).
Preço: R$ 40
Fonte: www.estadao.com.br 17 de março de 2010 0h 00
Roberta Pennafort - O Estadao de S.Paulo
RIO - Quando criança, no Timor Leste, o imaginário do pequeno Luís era impregnado por histórias da invasão japonesa à ilha, antiga colônia portuguesa, durante a Segunda Guerra Mundial. As histórias se multiplicaram em sua cabeça muito por conta da participação de seu pai na luta contra os invasores. O garoto cresceu, foi estudar em Portugal, transformou-se num belíssimo escritor - é considerado, no Ocidente, o primeiro romancista timorense -, e finalmente está sendo lançado no Brasil.
Réquiem para o Navegador Solitário sai pela editora Língua Geral, dentro da coleção Ponta de Lança, que apresenta autores lusófonos desconhecidos do público brasileiro - embora apenas um quinto dos timorenses falem português, a nossa língua é o idioma oficial por lá.
O livro saiu em 2007 em Portugal, país onde Luís Cardoso vive desde 1975. Já foi traduzido para vários idiomas, como inglês, alemão, holandês e francês. O escritor, que conhece pouco o Brasil, apesar de já nos ter visitado oito vezes, virá para o lançamento em Brasília, no dia 25; no Rio, será no dia 30.
O navegador solitário é Alain Gerbault, um francês que entrou para a história por ter feito uma viagem de circunavegação da Terra sozinho, num barco pequeno. A jornada começou em 1923 e durou 700 dias. Gerbault morreu em Díli, capital de Timor, em 1941. O personagem fascinava Cardoso, assim como outros estrangeiros que aportavam por lá.
A figura central de Réquiem, seu quarto romance, é Catarina, uma jovem inocente que viaja a Díli, pouco antes da guerra, atrás de seu noivo. Na mala, A La Poursuite du Soleil (em busca do sol) o relato da viagem escrito por Gerbault e publicado em 1929. Além de Catarina, outra personagem importante é a própria ilha do Pacífico, seus conflitos e delícias.
Réquiem leva o leitor numa interessante viagem pela terra de Cardoso. "Este é o livro que eu quis escrever desde a infância. Ainda pensei num título: Deus e o Diabo na Terra do Sol. Mas isso seria roubar o gênio a Glauber Rocha", brinca.
No seminário. Escritor de um país que praticamente não lê, Cardoso tem 51 anos. Nasceu em Cailaco, vila no interior do Timor. É filho de um enfermeiro e de uma dona de casa, irmão de dez. Estudou num seminário de jesuítas, onde aprendeu português, latim, grego, inglês e francês.
Já em Portugal, licenciou-se em silvicultura pelo Instituto Superior de Agronomia de Lisboa. Deu aulas de tétum, a língua falada pela maioria dos timorenses, e também de português. A virada para a literatura veio com o auxílio de José Eduardo Agualusa, o escritor angolano conhecido dos brasileiros. Eles estudavam juntos, e Agualusa viu em Cardoso um ficcionista de mão cheia.
O primeiro livro, Crônica de uma Travessia, foi publicado em 1997 pela editora Dom Quixote, a mesma de Agualusa. Com uma obra identificada com o realismo mágico (como García Márquez e Cortázar), Cardoso acabou mais conhecido em Portugal do que no Timor.
Ainda não se sabe se outros títulos sairão no Brasil. Cardoso cruzou oceanos para estar aqui nos anos 80, quando conheceu o então líder sindical Luiz Inácio Lula da Silva. Com ele, conseguiu apoio na luta pelos direitos humanos no Timor. O Brasil o encanta, o Rio especialmente.
"Sei ainda muito pouco do Brasil que gostaria de conhecer. Talvez precise de outra vida para concretizar isso", diz Cardoso, que sonha com dias de turista na cidade, entre o Cristo Redentor e o Pão de Açúcar. "Esta é minha primeira viagem ao Brasil desde a independência do Timor (em 99). No tempo da resistência (em Portugal, fez parte da Frente Diplomática de Timor, contra a presença indonésia) fiz viagens sempre a trabalho. Nem sequer tive tempo de cumprir uma promessa de ir até o Corcovado dar um abraço no Senhor, que lá está de braços abertos, à minha espera."
Apesar de rejeitar o título de "o escritor oficial de Timor", ou "o primeiro", ele sabe que por meio de seus livros apresenta seu país aos demais. Por conta deles, é chamado a dar palestras em universidades mundo afora.
"Acho que a tradição oral é o grande manancial da literatura timorense", avalia Cardoso. "É preciso trazê-la para a escrita. E isso cabe aos escritores. Tenho feito a minha parte. É na literatura oral que vamos buscar mitos e ritos, as tradições e todo um imaginário de identidade." Do Brasil, os timorenses se identificam com o futebol e as novelas da TV Globo.
RÉQUIEM PARA O NAVEGADOR SOLITÁRIO (Portugal)
Luís Cardoso
Editora: Língua Geral (303 páginas).
Preço: R$ 40
Fonte: www.estadao.com.br 17 de março de 2010 0h 00
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